Ouçam Nossas Vozes 2022
“Lunático(a)”, “surtado(a)”, “esquizofrênico(a)”, “retardado(a)” e “maníaco(a)” são apenas algumas das palavras associadas pejorativamente a pessoas que vivem com esquizofrenia, transtorno psiquiátrico que afeta 1,6 milhão de brasileiros(as), sendo a terceira causa de perda de qualidade de vida entre indivíduos dos 15 aos 44 anos, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS)¹.
Referida como sinônimo de desordem, imprevisibilidade e falta de bom senso, a condição é utilizada erroneamente em contextos de política e futebol, reforçando o preconceito e o estigma que já existem em relação às doenças mentais e seus(suas) pacientes.
Esse preconceito, somado à desinformação, não afasta somente as pessoas com doenças mentais do convívio social, mas causa impactos negativos no diagnóstico e na adesão ao tratamento o que, consequentemente, prejudica o controle da doença, assim como todos os envolvidos: pacientes, família e sociedade.
Com o intuito de conscientizar as pessoas sobre a importância da linguagem inclusiva em saúde mental, a campanha Ouçam Nossas Vozes lança o “Dicionário Anticapacitista em Saúde Mental”, que traz luz contra o capacitismo, termo discriminativo que se refere à falta de aptidão e capacidade de uma pessoa com deficiência (física ou mental) de realizar tarefas².
Além de retirar certas palavras e expressões do vocabulário, empregando intencionalmente uma linguagem inclusiva, é importante ter em mente que quem vive com esquizofrenia pode ter uma vida ativa e autônoma ao seguir corretamente seus tratamentos e manter acompanhamento médico especializado.
A campanha Ouçam Nossas Vozes nasceu da necessidade de conscientizar a sociedade sobre essa doença mental séria, que, se não for tratada adequadamente, pode ter graves consequências tanto para os(as) pacientes como para quem está ao seu redor. Agora, a campanha avança em mais uma etapa, com o objetivo de dar voz aos(às) pacientes, ampliar o diálogo e quebrar estigmas e preconceitos relacionados à doença. Apesar de não ter cura, a esquizofrenia pode ser tratada e ter os sintomas controlados – desde que haja diagnóstico e adesão ao tratamento prescrito pelo(a) médico(a). Com o transtorno sob controle, as pessoas com esquizofrenia podem ter uma vida plena e revelar todo o seu potencial, expressando talentos e habilidades que contribuem com a sociedade. A #OuçamNossasVozes é promovida com o apoio do Programa de Esquizofrenia (PROESQ) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), a Associação Mãos de Mães de Pessoas com Esquizofrenia (AMME), a Associação de Crônicos do Dia a Dia (CDD) e a Associação Gaúcha de Familiares e Pacientes Esquizofrênicos (Agafape). #OuçamNossasVozes banner a falta de compreensão
Não chame esquizofrenia de loucura
Diferentemente do que se imagina, a esquizofrenia é uma condição que pode ser compreendida. Ela possui particularidades: é uma doença que afeta o funcionamento do cérebro, relacionada a fatores como problemas na gestação e/ou no parto, problemas genéticos, problemas no amadurecimento do cérebro, fatores estressores além do que se pode suportar. Quando esse conjunto de fatores atua em uma determinada condição e período da vida, a pessoa pode desenvolver a doença. Um dos efeitos que promove a alteração de comportamento no(a) paciente é o aumento da função da dopamina, uma das substâncias químicas que nosso cérebro produz para que os neurônios se comuniquem.
Entendendo os sinais
Os sintomas da esquizofrenia geralmente começam entre 15 e 35 anos de idade. Em casos raros, crianças também podem apresentar as características da doença. Os principais sintomas se dividem em três tipos: positivos, negativos e cognitivos.
Tratamentos
Existem diversos fatores para o desenvolvimento de esquizofrenia: biológicos, psicológicos, ambientais e sociais. Por isso, o tratamento também precisa englobar abordagens múltiplas, passando pelo cuidado oferecido por médicos(as) psiquiatras e equipe de saúde multidisciplinar – incluindo tratamentos medicamentosos, psicoterapia e acompanhamento psicológico, além da atenção de familiares e da rede de apoio. Evitar recaídas, ou seja, novos surtos psicóticos, é o foco do tratamento, não apenas pelo impacto desses episódios na qualidade de vida do(a) paciente e sua família, mas também pelas perdas biológicas cerebrais que eles podem causar. Quando a doença é tratada correta e continuamente, com a estabilização dos sintomas e prevenção de recaídas, é possível que o(a) paciente viva de forma mais autônoma e saudável. Medicamentos são frequentemente usados para controlar os sintomas da esquizofrenia por reduzirem o desequilíbrio bioquímico característico da doença, prevenindo recaídas. Para isso, a adesão correta ao tratamento proposto é fundamental. A falta de adesão ao tratamento é um grande desafio: apenas cerca de um terço dos(as) pacientes seguem à risca as prescrições de medicamentos que devem ser tomados diariamente. Os tratamentos injetáveis de ação prolongada podem ajudar nesse sentido: mensais ou trimestrais, eles têm rápida ação e previnem recaídas, acarretando menos hospitalizações e outros desfechos graves decorrentes da doença.
Barreiras
A maior barreira é a aceitação da doença. Ela impacta na adesão ao tratamento, que também é comprometida pela dificuldade do(a) paciente de associar a terapia à melhora dos sintomas. A interrupção do tratamento contribui para a evolução do transtorno que, a cada crise, pode provocar danos cerebrais difíceis de serem revertidos. Além disso, a cada episódio, a recuperação pode ser mais lenta e o transtorno pode se tornar mais resistente ao tratamento, com impactos severos na autonomia do(a) paciente. A demora do encaminhamento ao(à) profissional especialista é outro fator que compromete o tratamento da esquizofrenia.
Estigmas: é preciso mudar
Estereótipos estão enraizados em nossas rotinas e as complicações mentais acabam, muitas vezes, distorcidas. É comum escutarmos em nosso dia a dia piadas pejorativas e de mau gosto que equiparam esquizofrenia à desordem, imprevisibilidade e falta de bom senso. Isso banaliza uma séria condição de saúde, alimenta o estigma e ofende os(as) pacientes e suas famílias.
O desconhecimento geral da sociedade sobre a esquizofrenia e a realidade das pessoas que convivem com a condição contribui para a perpetuação do preconceito e consequente isolamento dos(as) pacientes. Desconstruir estigmas torna possível oferecer as oportunidades necessárias para melhora e recuperação de milhares de pacientes e famílias que convivem com a esquizofrenia.
A esquizofrenia é uma doença grave?³
A esquizofrenia é considerada um transtorno mental grave e é definida como uma síndrome clínica complexa que compreende manifestações variadas de pensamento, percepção, emoção, movimento e comportamento.
A esquizofrenia é mais comum em homens do que em mulheres?
A esquizofrenia acomete ambos os sexos na mesma proporção. No entanto, as diferenças entre os sexos na esquizofrenia são descritas em relação a idade média de início, apresentação clínica, curso da doença e resposta ao tratamento. Por exemplo, os sintomas tendem a se manifestar um pouco mais cedo nos homens.
Quais são os principais sinais e sintomas da esquizofrenia?5
A doença causa distúrbios mentais graves, caracterizados por distorções de pensamento e da percepção, por inadequação e embotamento afetivo, sem prejuízo da capacidade intelectual (embora, ao longo do tempo, possam aparecer prejuízos cognitivos).
Existe algum exame laboratorial que diagnostique a esquizofrenia?5
Até o momento, não existe um exame laboratorial ou de imagem que permita confirmar o diagnóstico de esquizofrenia. O diagnóstico de esquizofrenia é clínico e baseado em critérios diagnósticos que precisam ser atendidos, como a presença de sinais e sintomas específicos e a exclusão de determinadas condições.
Pessoas com esquizofrenia são agressivas?6
Apesar da estigmatização e de muitas pessoas relacionarem a esquizofrenia a atos agressivos, não é verdade que os(as) pacientes sejam pessoas violentas. O que pode ocorrer é que, em períodos de não tratamento ou de tratamento não efetivo, os(a) pacientes podem apresentar comportamentos agressivos e/ou inadequados em decorrência da manifestação dos sintomas.
O que são as crises ou surtos psicóticos em pacientes com esquizofrenia?6
As crises ou surtos se caracterizam por alterações comportamentais agudas causadas principalmente por alucinações ou delírios. As pessoas em surto psicótico costumam perder o contato com a realidade e reagem de maneira muito diferente do habitual. Entre os sintomas mais comuns estão os delírios persecutórios (sentir-se perseguido por outras pessoas) e as alucinações auditivas, como, por exemplo, ouvir vozes que, dependendo da intensidade e natureza, podem deixar o(a) paciente mais agitado(a) e agressivo(a).
Pessoas com esquizofrenia podem ter uma vida ativa e autônoma?6
Isso é possível dependendo de como é feito o tratamento. Alguns aspectos muito importantes são: o tratamento precisa ser iniciado o quanto antes e o deve ser seguido da forma correta para evitar novas crises ou surtos. Isso significa que os sintomas da doença são atenuados no dia a dia, possibilitando que a pessoa tenha uma vida ativa e autônoma, sendo capaz de estudar, trabalhar e se relacionar com a família, amigos e cônjuge.
Quem vive com a esquizofrenia tem dificuldade para iniciar e manter atividades?7
Quando a esquizofrenia não está controlada, um dos sintomas observados pode ser a dificuldade de a pessoa iniciar algumas atividades e sentir dificuldade para mantê-las.
Precisamos ter medo de pessoas que vivem com a esquizofrenia?7
Não, essa atitude só reforça os estigmas e os preconceitos relacionados a quem vive com a esquizofrenia. A falta de informação, por falta de acesso ou de interesse, resulta em uma série de equívocos sobre a esquizofrenia. Graças ao progresso terapêutico, os(as) pacientes podem permanecer estáveis clinicamente. Dessa forma, devemos olhar para eles(as) com outros olhos e de maneira mais acolhedora.
O único tratamento que ajuda a reduzir os sintomas da esquizofrenia é a medicação?7
Os medicamentos integram parte essencial do tratamento da esquizofrenia, mas, para que seja ainda mais eficaz, intervenções psicossociais, como as atividades educativas, sociais e ocupacionais, são necessárias. Elas podem contribuir muito para que os(as) pacientes com esquizofrenia melhorem a habilidade de conviver com a doença, se recuperem e tenham capacidade de se reintegrar à sociedade.